Um pouco de política não faz mal a ninguém
Paulo Schultz é nosso persona da semana
Sim, nós vamos abordar política no Retratos da Alma dessa
semana.
Porque temos que tocar na ferida e porque junto com essa
pandemia que estamos enfrentando, está aí o período eleitoral não é mesmo?
E um pouco de noções da política não faz mal a ninguém,
pelo contrário, tudo é conhecimento e aprendizado.
...
Ele parece um cara tímido e contido, mas é incisivo nas
suas colocações bem elaboradas e certeiras sobre política e comportamento
social do nosso povo brasileiro.
O professor Paulo Schultz é o persona dessa semana para o
nosso Retratos da Alma. Ele que tem uma coluna no Portal Zulupa, um site maneiríssimo
que abrange a Região Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.
Paulo é natural de Santa Rosa, professor de Inglês, se
formou aos 21 anos como Tradutor de Inglês e Alemão na PUC – RS.
Antes de ir para nossa entrevista com o convidado, é
preciso destacar que Paulo tem uma longa
trajetória na vida política, a qual foi
despertada ali pelos seus 18 anos, quando morava em Porto Alegre, sempre
identificado com a ideologia de esquerda.
Filiado há mais de 25 anos no Partido dos Trabalhadores,
ele já foi até candidato a vereador, mas diz que foi “o suficiente pra aprender
que não tem perfil pra ser candidato”. Sendo então membro da executiva do
partido várias vezes e, atualmente Secretário de Formação Política da executiva
do PT de Santa Rosa.
O
professor também nos conta, e vamos falar logo na sequência, que já teve até uma
banda de rock, quando morava na capital gaúcha. Tocava guitarra e cantava,
mesmo que limitadamente como ele faz questão de destacar, mas cantava...
P. S.
-
Tem sido uma boa experiência.
A ideia, desde o início, foi propor reflexões sobre a
conjuntura política e comportamentos sociais, e instigar que os leitores se
utilizem destas reflexões como estímulo a pensar política e socialmente
posturas de enfrentamento ao quadro atual, e como é possível construir outro.
É um trabalho contínuo, feito semana a semana, uma
narrativa em etapas.
Já tive ofensas e agressões verbais, mas também retornos
muito significativos.
R. A. - Essa semana comemoramos o Dia Internacional do Rock e tu teve até
uma banda de Rock, quando morou na capital Gaúcha. Como foi essa experiência?
Tu ainda praticas esse dom musical nos dias de hoje?
P.
S. Minha
adolescência foi nos anos 80, que foi o grande momento do rock nacional,
momento de explosão do rock.
Então todo mundo que viveu essa fase da vida naquela
época, e tinha alguma veia musical e gosto pelo rock, passou pela experiência
de ter tido uma banda.
Éramos entre três. Tínhamos composições próprias,
chegamos a gravar em estúdio algumas.
Uma época pré-digital, em que os estúdios ainda gravavam
em fita rolo.
A banda durou alguns anos, depois cada um seguiu o seu
rumo profissional, mas foi uma grande experiência de vida.
Ainda temos registros das músicas.
A vontade de tocar, de fazer música, ainda existe, mas
acho que isso vai acabar acontecendo daqui a um tempo, no futuro, quando tiver
um tempo mais livre para me dedicar a isso.
R. A. - Sendo várias vezes membro da
executiva do PT em Santa Rosa e atualmente Secretário de formação política do
partido, fala um pouco dessa vivência nos dias de hoje? A relação com as redes
sociais e o turbilhão de informações que se recebe diariamente, como se dá a
política partidária no meio disso tudo?
P.
S.
É preciso manter coerência com os fundamentos ideológicos do PT, e da esquerda,
de uma maneira mais ampla.
É preciso garantir, por exemplo, que a prática política a
que o PT se propôs a desenvolver internamente, e na sociedade, continue
vigorando.
Óbvio que nós não estamos mais numa sociedade igual
àquela que deu origem ao PT, no início dos anos 80.
E o próprio PT mudou, em meio a isso tudo.
Mas os princípios ideológicos tem que ser mantidos, mesmo
com a prática política aperfeiçoada e adaptada à nova realidade de agora.
Hoje temos uma porção razoável do fazer político sendo
realizado pelas redes sociais, por exemplo.
Mas é preciso que essa plataforma de rede, usada para
atividade política, esteja em consonância com os princípios e fundamentos
essenciais e caros ao PT, e à esquerda, de modo geral.
R. A. - Com a tua trajetória política,
como tu vê a esquerda de ontem e de hoje? O que falta, por exemplo, ao PT de
hoje, que existia no PT lá do início?
P.
S. -
Há um excesso de institucionalização, não só no PT, mas quase que no geral da
esquerda brasileira.
Isso faz com que se perca muito o contato com as bases
sociais que devem ser o esteio da ação da esquerda.
E também acaba gerando uma postura acomodada, marcada
pela falta de ímpeto e ousadia.
Veja, por exemplo, o não envolvimento quase total dos
partidos de esquerda nos protestos de rua contra o governo Bolsonaro, que foram
puxados por torcidas de grandes times de futebol do país, algumas semanas
atrás.
Além da ausência quase total, muitos da esquerda
reprovaram o movimento.
Um erro político terrível, porque, ao não encorpar, dar
suporte ao movimento, que era extremamente popular, a esquerda ajudou a murchar
algo que poderia ser o germe de uma ação de massa para encurralar politicamente
o governo Bolsonaro.
Creio que a esquerda tomou essa linha por excesso de
apego à institucionalidade, e aos calendários eleitorais.
Houve a justificativa da epidemia, mas, se a gente olhar
bem, aquele povo que foi às ruas, é um povo que não teve direito ao isolamento
social.
Um povo que não pôde ficar em casa resguardado, teve que
continuar trabalhando, e se expondo ao risco do vírus.
Então, qual sentido teria dizer para eles ficarem de
resguardo num domingo, se durante o resto da semana eles já estavam em
circulação na rua, por terem que ir para o trabalho, seja formal ou informal.
R. A. - De professor de Inglês à militante
político, qual a relação entre as funções?
P. S.
-
Olha, isso é uma coisa que eu procuro evitar, especialmente em sala de aula.
Claro que, em alguns momentos, alguém acaba perguntando
para mim sobre determinado assunto relacionado a isso, e eu geralmente não me
furto a responder, mas costumo ser breve na resposta, para não criar nenhum
tipo de encrenca.
R.A. - Quais tuas perspectivas com
relação a tua carreira, e os rumos da política nos níveis municipal, estadual e
federal?
Olha, em relação à carreira, é preciso pesar seriamente o
quanto valerá, ou não, a pena continuar no magistério.
Em relação à política, é um trabalho contínuo, uma
construção, um movimento permanente.
O que vem em primeiro plano, neste quesito, são as
eleições municipais deste ano, onde espero uma vitória (que está bem plausível)
do PT, da esquerda, no meu município, assim como espero êxitos do PT, e demais
forças da esquerda, pelo país afora, na maior quantidade e intensidade
possível.
É um passo importante e necessário para enfrentar a
destruição e a maldade que vem do governo federal, e mostrar que uma outra
forma de governar é possível e viável, como já se provou ser.
R. A. - Como foi a experiência de se
candidatar a vereador? Por que achas que não tens perfil de candidato?
P.
S. -
Foi uma rica experiência há um bom tempo atrás, em 1996.
É uma escola onde se você pode aprender várias coisas
sobre política, e também comportamento em vários segmentos da
sociedade.
Aprendi uma série de coisas que levei para a ação de
militância ao longo dos anos.
E, no meio disso tudo, aprendi que não tenho perfil para
concorrer a cargo eletivo.
Meu chão, na política, é em outro campo de ação, que não
o de ser candidato.
R. A. Este ano é um ano eleitoral, por
mais atípico que seja. Como se dará e está acontecendo então a mobilização, a
campanha em si, num momento de pandemia que estamos vivendo?
P.
S. -
Tem sido, até este momento, basicamente por redes sociais.
Creio que será assim por uma boa parte do período
eleitoral.
É uma situação diferente e atípica, mas que pode deixar
como marca novas formas de fazer política e se envolver politicamente.
Embora eu ache que nos pequenos municípios essa atuação
via redes talvez tenha um volume menor, pela característica do comportamento
social de mais contato direto entre as pessoas.
De qualquer forma, desse período que estamos vivendo,
ficarão novas formas, que vão se agregar ao modo tradicional de fazer política,
e até substituir alguns hábitos políticos, em maior ou menor escala, dependendo
dos contextos locais.
R. A. - E por fim, qual é tua análise da
atual conjuntura política de modo geral, em especial com relação ao
bolsonarismo. Por que Jair Bolsonaro ainda está no poder?
O Bolsonarismo é um sintoma.
Sintoma de uma sociedade adoecida.
Em condições normais da vida social e política do país,
jamais uma figura como Bolsonaro seria eleito.
Bolsonaro é um fruto dele mesmo, e de um movimento que
começou em 2013, que foi gradativa e intensivamente criminalizando a atividade
política, passando depois pela retirada da ex-presidente Dilma do governo,
através de um impeachment forjado.
Essa ruptura na normalidade democrática, por meio de um
mecanismo legal, mas usado com sordidez, ocorrida em 2016, criou um desarranjo
social e político, e acabou servindo de plataforma por onde Bolsonaro passou e
soube juntar para si esse sentimento anti- política e anti-sistema.
O que na verdade é uma grande mentira, porque alguém que foi
por quase 30 anos deputado, não é alguém fora do sistema e fora da política.
Aliás, em relação a isso, é preciso frisar que Bolsonaro,
durante sete mandatos como deputado federal, foi uma figura absolutamente
medíocre, que às vezes aparecia na
mídia, não por qualidade de seu trabalho parlamentar, mas por conta dos seus discursos e rompantes
violentos e lunáticos.
Tenho afirmado, e expresso isso através das minhas
colunas, que Bolsonaro é burro porque não domina tema nenhum (saúde, educação,
etc.), mas é um espertalhão, extremamente sagaz, porque sabe muito bem como
manipular, principalmente esse pessoal do bolsonarismo raiz, os seguidores
fiéis, com seus discursos e atos.
Ele sabe onde quer chegar.
Bolsonaro quer implantar no país um modelo
anarcocapitalista de sociedade, onde o estado se ausenta de políticas públicas
sociais, e elas não vão ser repassadas para o setor privado, mas sim assumidas
pelas igrejas evangélicas.
Uma sociedade onde o poder público se exime da segurança
pública, abrindo espaço para que milícias dominem, como já acontece no Rio de
Janeiro.
Uma sociedade onde o poder público se exime de ser
mediador das relações de trabalho, da proteção ambiental, e da proteção às
minorias.
Na lógica simplista e torta de Bolsonaro, tudo se resolve
deixando a sociedade livre para resolver tudo com armas e pela lei do mais
forte, e deixando o capital solto para crescer em cima do esmigalhamento e
precarização dos trabalhadores.
Bolsonaro é uma bizarrice, um ser torto, que eu, a
princípio, apostava que não chegaria ao fim do mandato.
Porém, com a recente compra mútua entre Bolsonaro e o
centrão, com quase 3 mil militares ocupando cargos em confiança no governo, e
se fartando de uma série de privilégios que isso dá, somado ao fato de que o
mercado financeiro tem plena confiança na pauta privatista do ministro Guedes,
e, ainda, se conseguirem fazer Bolsonaro se manter em silêncio poético (como
nas últimas semanas), é possível que chegue até o fim do mandato, com muito
mais estragos feitos na vida das pessoas e do país, do que os que aconteceram
até aqui.
Beleza. Precisamos muito de entender o momento em que estamos. As definições que ocorrem na política, saúde, economia, meio ambiente afetam a vida de cada um. Precisamos estar conscientes. Valeu.
ResponderExcluirAgradeço a participação, Mario. ✋ Paulo Schultz
ExcluirBem interessante a entrevista. O final sintetiza muito bem as ideias de Bolsonaro e dá medo de pensar nas consequências se implementadas todas as concepções de Bolsonaro.
ResponderExcluirCabe a cada um de nós a tarefa dura e necessária de impedir, José.
ExcluirPaulo Schultz
Muito boa a materia gente que compõe a construção politica sempre tem boas historias...
ResponderExcluirAgradeço a leitura e as palavras, Paulo.
ExcluirAbraço. ⭐
Parabéns pela entrevista. Nela a população pôde conhecer um pouco mais dessa figura ímpar, que é o Paulinho. Como ele mesmo define, não tem perfil pra ser candidato. E penso que o faz em razão do paralelo com os eleitos, uma vez que a presença de um debate qualificado, de alto nível, educacional e cultural, é uma raridade nas Câmaras de Vereadores. E quando alguém se propõe a fazê-lo é visto como o "chato"...nada diferente do momento político brasileiro, onde a ignorância, me parece, ganhou ares de orgulho.
ResponderExcluirO cenário político atual faz parte de um ciclo. Logo se fecha e se inicia outro. Essa é a dialética do mundo. Nos posicionarmos sobre ela é muito importante para que o processo seja depurado, pois sem isso, se torna mais demorado e catastrófico.
Abraço, Paulo Schultz! Avante!
Este comentário foi removido pelo autor.
ExcluirGrande companheiro Ximia. Agradeço a generosidade das tuas palavras. Sigamos na boa luta. ⭐
ExcluirProfessor Paulo! Excelente entrevista e principalmente uma análise conjuntural perfeita.
ResponderExcluirObrigado Lúcia. Agradeço a atenção. Grande abraço ✋
ExcluirParabéns Paulo, muito boa a Intervista, analise ótima.
ResponderExcluirObrigado. Agradeço a participação. Abraço ✋
ExcluirMuito boa entrevista. Creio que o diagnóstico do entrevistado quanto à institucionalização da esquerda é correto. Em partes, seria inevitável em função da participação nos governos Lula e Dilma. Mas perdeu-se o contato com as bases. E será um longo caminho até reconstruir esses vínculos.
ResponderExcluirÉ um caminho a ser refeito, Vinícius, com firmeza e sabendo que os tempos são outros, o que não nos exime de manter os mesmos fundamentos ideológicos. Abraço ✋
Excluirboa entrevista, no entanto, foge ao não colocar que o culpado por o Brasil ter o atual presidente foi culpa sim de Lula, que inelegível era no ano de 2018, ainda assim, bateu pé de ter seu nome como elegível e deu no que deu.
ResponderExcluirVários fatores construíram a circunstância infeliz que levou essa criatura bizarra e perigosa ao cargo de presidente. Abraço ✋
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